EnDireitando Tudo. Direito a saúde e o uso da fosfoetanolamina sintética.
- Ana Paula Brito Oliveira.
- 16 de jun. de 2016
- 4 min de leitura
Em recente informativo 826 do STF, tratando-se de decisão cautelar, sem julgado ainda definitivo, considerou-se inconstitucional a Lei nº. 13.269/2016.
A lei que autorizava o uso de fosfoetanolamina (pílula do câncer) no tratamento de pacientes com câncer ou neoplasia maligna, foi considerada inconstitucional, isto, porque não existem registro da substância perante a ANVISA e os estudos e análises do uso da pílula do câncer em seres humanos, ainda não são conclusivos em relação a seus efeitos colaterais.
Para entender um pouco melhor o que vem acontecendo, segue um histórico dos fatos.
Na década de 1970, Gilberto Chierice (USP), desenvolveu uma substância chamada fosfoetanolamina sintética, que conforme ele, serviria para auxiliar na cura contra o câncer. Desta forma, desde daquela época a fosfoetanolamina sintética foi distribuída de forma gratuita para enfermos com câncer que concordavam a se submeter as pesquisas. Surge aí, a substância que se popularizou como "pílula do câncer".
Observa-se que essa substância foi ministrada aos doentes sem qualquer aprovação pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA).
No ano de 2014, através de uma portaria a USP se manifestou e proibiu a distribuição da fosfoetanolamina até que ocorresse a aprovação pela ANVISA.
A proibição da substância fez com que diversas pessoas com câncer, que se submetiam as pequisas ou queriam participar delas, bem como seus familiares, entraram em campanhas a favor do uso da fosfoetanolamina e liberação dela, buscando assim, a Justiça/Poder Judiciário,e pleiteando a liberação da substância e queda da proibição portaria USP.
Dada a repercussão do ocorrido, o Congresso Nacional aprovou a Lei nº 13.269/2016 que autoriza o uso da fosfoetanolamina sintética por pacientes portadores de câncer, mesmo sem a aprovação da Anvisa e sem o controle prévio sanitário.
Art. 1º, da Lei. Esta Lei autoriza o uso da substância fosfoetanolamina sintética por pacientes diagnosticados com neoplasia maligna.
Art. 2º Poderão fazer uso da fosfoetanolamina sintética, por livre escolha, pacientes diagnosticados com neoplasia maligna, desde que observados os seguintes condicionantes:
I - laudo médico que comprove o diagnóstico;
II - assinatura de termo de consentimento e responsabilidade pelo paciente ou seu representante legal.
Parágrafo único. A opção pelo uso voluntário da fosfoetanolamina sintética não exclui o direito de acesso a outras modalidades terapêuticas.
A Associação Médica Brasileira (AMB) não concordando com tal posicionamento, ajuizou a ADI contra a Lei nº. 13.269/2016. Alegando ser incompatível com os direitos previstos na constituição nos artigos 6º e 196, direito a saúde, artigo 5º, direito a segurança e a vida, e artigo 1º, III, direito a dignidade da pessoa humana, já que em análise dado o “desconhecimento amplo acerca da eficácia e dos efeitos colaterais” da substância em seres humanos, sua liberação seria uma ofensa a tais direitos constitucionais e a integridade física dos pacientes. O que os colocaria em risco grave à vida.
Na ADI, argumentou-se também que a fosfoetanolamina sintética foi unicamente utilizada em camundongos, e somente apresentou eficácia ao combate do melanoma/câncer de pele. E que nem mesmo a tal substância, quando utilizada em seres humanos passou pelos testes clínicos exigidos pela legislação.
O STF, na medida cautelar, concordou com a tese defendida na ADI. Veja, em medida cautelar, o que significa que o STF ainda não concluiu o julgamento, mas, majoritariamente, decidiu e deferiu medida liminar suspendendo a eficácia da Lei nº 13.269/2016. In verbis:
É inconstitucional a Lei nº 13.269/2016, que autorizou o uso da fosfoetanolamina sintética ("pílula do câncer) por pacientes diagnosticados com neoplasia maligna, mesmo sem que existam estudos conclusivos sobre os efeitos colaterais em seres humanos e mesmo sem que haja registro sanitário da substância perante a ANVISA. STF. Plenário. ADI 5501 MC/DF, Rel. Min. Marco Aurélio, julgado em 19/5/2016 (Info 826).
O que se pode extrair da decisão é que sim, o Poder Público tem dever de fornecer remédios/medicamentos e tratamentos médicos, mas deve agir com responsabilidade perante a população, na busca pela qualidade e segurança dos produtos e substância utilizados no território nacional. Além de que a Lei nº. 6.360/76, artigo 12, diz ser obrigatório aprovação e registro da substância/produto pelo Ministério da Saúde para que ocorra a fase de industrialização com finalidade comerciais.
No mais, o princípio da separação dos Poderes foi ofendido pela Lei nº. 13.269/2016, tendo em vista que é dever do Estado zelar pela saúde da população, e não, do Congresso Nacional por intermédio de Lei. Vejamos, a ANVISA, autarquia vinculada ao Ministério da Saúde, foi criada com fito e dever de elaborar estudos técnicos, protocolos, controles e até mesmo autorizações nas distribuições de substâncias químicas, sendo extremamente preocupante, a liberação da substância fosfoetanolamina somente através de Lei aprovada pelo Congresso sem levar em conta estudos técnicos científicos seguros da eficácia, bem como comprovação de efeitos coltareis não graves a saúde e a vida humana.
Por fim, as últimas notícias sobre a pílula do câncer são que a Defensoria Pública da União no Rio de Janeiro, vai entrar com ação civil pública contra o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) pedindo a anulação dos testes feitos com a fosfoetanolamina sintética, para o defensor público competente, as pesquisas têm falhas e erros metodológicos.
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